terça-feira, 16 de dezembro de 2014

O culpado não existe

A atribuição de culpa, a si próprio ou a outrem, corresponde a um isolamento de uma parte da realidade, dado que se deixa de interpretar o Nós, abrangente, para se discutir as partes ilusoriamente separadas do Eu e do Tu, ficando, assim, estas identidades desvalorizadas nos seus reais papéis interpessoais. Nesta medida, as atribuições de culpa são distorções ou erros de análise, uma vez que são excluídas observações relevantes de um todo em apreciação. Numa qualquer relação não existe, de facto, um culpado pelo que sucede; existem, sim, responsáveis, co-construtores nas múltiplas dinâmicas que vão sucedendo no Nós.

Numa qualquer relação, o que sucede é mesmo resultado da acção de todos os seus intervenientes e, nesta forma de entendimento, a culpa não consegue sobreviver, dado que a sua natureza de restrição não se adapta a um «meio ambiente» de compreensão global dos fenómenos interpessoais. No entanto, pelo facto de não existir, na realidade, «o culpado», não se deve assumir uma outra ideia errada, designadamente a da desresponsabilização de cada um no resultado global, mas sim prosseguir uma perspectiva lúcida de desenvolvimento conjunto: todos podemos ser importantes agentes de bem-estar nos sistemas relacionais onde nos encontramos (familiar, social e laboral). Deste modo, de uma forma simples, a noção de uma genuína responsabilidade vive-se através de exemplos deste tipo: “Vamos lá identificar, claramente, o que ambos queremos, porque é nisso que eu quero investir!”.