Há pessoas que se colocam, sistematicamente, num registo de dar, nomeadamente ao fazerem inúmeras coisas pelos outros, mostrando uma imensa disponibilidade de ajuda. Esses exacerbados investimentos podem ser, também, demonstrados em ofertas de bens materiais, mostrando uma aparência de enorme dedicação e altruísmo que cria, inevitavelmente, um grande impacto nos receptores.
Que impacto é esse? Desde logo, transmite-se a ideia de que essa pessoa ultra-generosa será maravilhosa, imaculada e, por isso, não deve ser sujeita a qualquer crítica. Por conseguinte, uma pessoa que não é merecedora de críticas, não pode ser concebida como um depositário de culpa... Ora, este é um dos ganhos fundamentais obtidos pelo super-dador, no âmbito do sistema relacional em que actua: nas suas múltiplas e/ou valiosas ofertas aos outros, são também cedidos recipientes psíquicos de culpa, juntamente com conteúdos insuportáveis dessa natureza. De facto, quando as dádivas são excessivas, quem as recebe beneficia dessas explícitas ofertas, mas, "ganha", inelutavelmente, sentimentos exacerbados de dívida - intensa culpa a ser reparada - que, conscientemente, passa por uma vivência de ansiedade corrosiva, dada a "imposta" necessidade moral de retribuir os gigantescos investimentos recebidos.
Por outro lado, o verdadeiro Amor passa por cultivar o Amor próprio do outro, estimulando o seu processo de autonomia e crescimento pessoal, ou seja, a sua capacidade de investir na concretização dos seus próprios sonhos. Um sonho pessoal concretizado totalmente, ou em grande medida, através do esforço de outra pessoa, não permite a felicidade genuína da auto-realização e, pior do que isso, diminui o sentimento de Amor próprio, dado o esvaziamento desse fluído vital que é encaminhado, infelizmente, para a idealizada imagem extraordinária do hiperbólico ofertante...