Considero que o amor incondicional é uma postura amorosa face ao Mundo e, desta forma, os actos que revelam essa qualidade não se dirigem, recorrentemente, a determinados seres e objectos, e não implicam obter algo em troca dos outros para sustentarem a sua continuidade, já que a alegria interior subjacente à dádiva incondicional supre essa necessidade. A vertente incondicional do amor é, assim, verdadeiramente abrangente no seu propósito, correspondendo à forma mais evoluída de expressão amorosa do altruísmo e compaixão.
Quando o ser humano privilegia determinadas pessoas, outros seres vivos, objectos materiais ou conceptuais, para investir a sua atenção e afecto, a natureza desses amores é inexoravelmente condicional, já que a particularização de um Todo é, obviamente, uma condição, no sentido de delimitação, em que uns são mais relevantes do que outros, para o ser que investe o seu amor. Concretamente, no que respeita ao domínio humano, as relações de amizade, de namoro e conjugais, possuem sempre o vínculo de amor condicional, uma vez que, na sua génese e continuidade, se destacaram, na perspectiva do sujeito face ao mundo que o rodeia, determinadas pessoas que lhe mereceram, por qualquer razão, um investimento de índole preferencial.
Nesta óptica, o amor condicional será melhor vivido se a reciprocidade for uma prática comum nos parceiros de relação, uma vez que, como o psicanalista Coimbra de Matos bem salienta, quem, de forma continuada, dá mais amor do que recebe numa determinada relação, desenvolve uma atitude de economia depressígena, cuja consequência é a frustração penosa inerente ao culminar do estado de depressão. Porém, mesmo para quem, sistematicamente, recebe mais amor do que dá, apenas aparentemente esse resultado líquido lhe é favorável em termos narcísicos, porque numa relação em que não existe uma diferença de gerações e/ou de papéis que o justifique - cujo paradigma é a relação entre pais e filhos, em que os pais, enquanto cuidadores e educadores, devem exercer um tipo de amor que corresponde em termos operacionais à dinâmica do amor incondicional, mas neste âmbito de relação restrita, como forma de promover o bom desenvolvimento dos seus filhos - o sentimento de dívida culposa acaba por provocar um dano narcísico.
Assim, exceptuando a situação relacional pais-filhos - ou em que existe um vínculo dessa natureza - dado que é tipicamente humana a valorização especial de determinadas identidades, ou seja, ter um maior ou menor número de relações de amor condicional, a melhor forma de as conduzir é cumprir a lei da reciprocidade, em que cada actor, ao possuir determinadas qualidades diferenciadas, contribui com bons investimentos de natureza específica para a relação, mas em que ambos os sujeitos devem sentir as suas experiências vivenciais enriquecidas, de forma quantitativamente semelhante.
Deste modo, realce-se que as relações de amor condicional não estão condenadas a fracassar nos seus objectivos, uma vez que, quando são muito saudáveis - respeitando o melhor possível a reciprocidade - promovem até o crescimento do amor incondicional dos seus participantes. Na realidade, os sentimentos de amar e ser amado de forma similar, proporcionam tranquilidade e alegria nessas relações particulares, reforçando o sentimento de confiança básica na bondade intrínseca dos outros, que é a semente do amor incondicional. Por conseguinte, estas boas relações preferenciais, ao atingirem as suas metas específicas, desenvolvem-se, naturalmente, na constituição de terrenos férteis para o cultivo de sentimentos de amor mais global.